quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Rastros de morte. E a terra veio abaixo

Chuvas causaram a morte de pelo menos 540 pessoas em Nova Friburgo, Teresópolis e Petrópolis

Atualizado em 14/01, as 2h14min
Enterro de vítimas das chuvas no Cemitério de Teresópolis

Depois de dois dias de chuva forte na Região Serrana do Rio, subiu para 540 o número de mortos na área. Em Nova Friburgo, o número de vítimas chega a 168, segundo informações da assessoria de imprensa da Prefeitura de Friburgo, na manhã desta quinta-feira (13).

Nas cinco cidades afetadas foram 549 mortos, sendo 246 em Nova Friburgo, 43 em Petrópolis e quatro em São José do Vale do Rio Preto.

Em Teresópolis, o Ministério Público determinou a exumação dos corpos enterrados até 2007 para aumentar o número de covas para as vítimas da tragédia desta semana.

No município de Nova Friburgo, o secretário municipal de Comunicação, David Massena, disse que ainda há “muitos corpos” sob escombros na cidade, já que os bombeiros ainda trabalham no resgate das vítimas e sequer chegaram a alguns pontos isolados do município.

As fortes chuvas que atingiram a região serrana na noite da última terça-feira duraram cerca de quatro horas e provocaram deslizamentos de terra e lama. A tragédia é considerada a maior catástrofe natural já registrada no país.
Deslizamento de terras em Nova Friburgo

Pelo novo balanço, o número de total de vítimas até as 7h40 desta quinta é de 155 mortos em Friburgo, 146 em Teresópolis e 36 em Petrópolis, onde a maioria das vítimas foi encontrada no Vale do Cuiabá, no Distrito de Itaipava.

Choveu forte durante a madrugada de quinta-feira (13) nos acessos a Teresópolis. Na cidade, os bairros mais atingidos, segundo a Defesa Civil, são Caleme, Posse e Campo Grande. A Defesa Civil, que ainda não conseguiu chegar ao bairro de Campo Grande, acredita que mais de duas mil casas tenham sido destruídas pela chuva e que cerca de 150 corpos estejam na região. Eles vão tentar chegar a este bairro nesta manhã.

As buscas por outras vítimas na Região Serrana terão o apoio de helicópteros nesta quinta-feira (13). Durante a madrugada, uma chuva fraca atingiu as cidades de Teresópolis e Petrópolis, mas sem registro de novos deslizamentos. Em Nova Friburgo, a comunicação ainda é precária, já que o sistema de telefonia foi atingido.

A procura por desaparecidos continuou durante a madrugada em Friburgo e Teresópolis, mas teve que ser interrompida em Petrópolis, onde a falta de luz prejudicou os trabalhos. Segundo bombeiros, por volta das 7h, os trabalhos recomeçaram na cidade. Vários bairros da Região Serrana foram atingidos.

A infraestrutura da região foi atingida com severidade. Houve falta de luz, telefone e transporte nas três cidades. Bairros inteiros ficaram isolados e só na noite desta quarta-feira (12) equipes de resgate começaram a dar conta da catástrofe em algumas das áreas mais atingidas. Em um desses esforços, foi resgatado com vida, sem arranhões, um bebê de seis meses de idade em Friburgo.

Oitocentos homens da Defesa Civil e do Corpo de Bombeiros tentam localizar desaparecidos em Teresópolis. O secretário do Ambiente do estado do Rio de Janeiro, Carlos Minc, classificou a chuva como a "maior catástrofe da história de Teresópolis". "Não foi possível escolher o que ia cair. Casa de rico, casa de pobre. Tudo foi destruído", disse a empregada doméstica de 27 anos, Fernanda Carvalho.

A prefeitura designou dois abrigos para receber desabrigados: o Ginásio Pedrão, no Centro de Teresópolis, com capacidade para 800 pessoas, e um galpão no Bairro Meudon, onde podem ser alojadas 400 pessoas. Os desalojados na cidade são 1280 e os desabrigados, 960.

Os bairros mais atingidos em Teresópolis foram Bonsucesso, Caleme e Biquinha. Também registraram vítimas Poço dos Peixes, Vale Feliz, Fazenda da Paz, Posse, Paineiras, Jardim Serrano, Parque do Imbuí, Granja Florestal e Barra do Imbuí, Pessegueiros e Salaquinho.

Em Nova Friburgo, a maior parte das vítimas morava no bairro de Conselheiro Paulino. A chuva forte deixou a cidade sem sinal de telefonia, sem luz e sem transporte na quarta (12). À tarde, moradores perambulavam pela cidade cheia de lama sem saber o que fazer. O ginásio de uma escola estadual é usado como necrotério.

Na vizinha Petrópolis, o cenário é semelhante. No distrito de Itaipava, a água atingiu dois metros e meio de altura em alguns pontos da região. Uma escola no distrito abriga 30 famílias desalojadas.

Nelson Machado de Souza, 61 anos, diretor de qualidade da Cervejaria Petrópolis, foi mais uma das vítimas das chuvas. A casa dele e de seus dois filhos - uma ao lado da outra -, no Vale do Cuiabá, foram invadidas pelas águas que transbordaram do Rio Santo Antônio, que atingiu uma extensão de pelo menos 10 quilômetros levando tudo que estava pela frente: "Em pouco mais de 15 minutos, tudo o que era conforto virou um brejo, lamaçal", disse.

O trabalho de resgate das vítimas da tragédia causada pela chuva na cidade é reforçado por homens do Grupamento de Busca e Salvamento que atuaram no Morro do Bumba, em, Niterói, em Angra dos Reis e no Haiti. À noite, integrantes desse grupamento resgataram com vida um bebê de seis meses de idade. Também resgatado com vida, o pai dele passou 15 horas soterrado, abraçado ao filho.

A Defesa Civil da prefeitura de Petrópolis explica que "toda vez que chove muito nos municípios de Teresópolis e Nova Friburgo, a água que desce da serra provoca o transbordamento do rio Santo Antônio, causando os alagamentos".


Prefeituras foram alertadas

As prefeituras de Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo foram alertadas regularmente pelo Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do Rio (Crea-RJ) sobre a ocupação desordenada das encostas nos últimos dois anos. A afirmação é do presidente da entidade, Agostinho Guerreiro.

Ele afirmou que o planejamento urbanístico da ocupação do solo na Região Serrana é "próximo de zero". "As prefeituras são despreparadas do ponto de vista técnico e permite tanto a ocupação de encostas pelos menos favorecidos como construções de grandes condomínios de luxo em nome do turismo", afirmou.

O secretário estadual de Meio Ambiente do Rio, Carlos Minc, esteve ontem nos municípios atingidos pelos temporais e reforçou a necessidade de combater as ocupações irregulares e ampliar as áreas de proteção, a fim de evitar desastres semelhantes. "Trata-se da combinação de uma catástrofe natural com uma irresponsabilidade absoluta", afirmou.

As enchentes na Região Serrana do Rio ocorrem desde os anos 1960. A pior delas até hoje aconteceu em 1988 na cidade de Petrópolis e deixou pelo menos 171 mortos. Na ocasião, em todo o Estado do Rio, o número de óbitos chegou a 300, entre pessoas que foram soterradas por deslizamentos, vítimas de desabamentos e afogados levados pelas águas dos rios que se formaram nas ruas.


Combinação de deslizamento raro e ocupação irregular

A catástrofe na região serrana do Rio de Janeiro foi causada por um tipo de deslizamento considerado raro e avassalador por geólogos. Além do escorregamento de terra, a tragédia foi agravada por um fenômeno chamado de corrida de lama e detritos. É quando uma série de deslizamentos acontece ao mesmo tempo, no mesmo lugar, e tão rápido que praticamente impede que as pessoas se protejam. Trata-se da maior magnitude de escorregamento de terra possível.

"É uma avalanche de poder destrutivo estúpido", explica o geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos, ex-diretor de Planejamento e Gestão do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). "A massa de terra e detritos acaba com o que está pela frente".

Essa avalanche fez com que corpos das vítimas fossem carregados morro abaixo por até 15 quilômetros de distância. "Na verdade, o deslizamento é a massa de solo que desloca. Chove, encharca e desloca", diz Kátia Canil, do Laboratório de Riscos Ambientais do IPT.

"A corrida ocorre quando vários deslizamentos se juntam, formam uma massa maior com árvores, terra, água e detritos e destrói o que vem pela frente. É muita velocidade".

Esse tipo de fenômeno é considerado incomum porque é necessário uma somatória de fatores, como uma grande quantidade de chuva, um solo já encharcado e instável e declives muito acentuados.

Ainda que tenha um grande poder de destruição, a "corrida" no Rio só causou tantas mortes porque, a exemplo de outras cidades brasileiras, Teresópolis, Nova Friburgo e Petrópolis sofrem com a ocupação desordenada de encostas - por favelas e por loteamentos de classe média e de luxo.

Ainda de acordo com especialistas, o poder público também tem sua parcela de culpa pela tragédia, por não fiscalizar a ocupação do solo.

"É bom sempre frisar que a responsabilidade não deve ser creditada a fenômenos como o aquecimento global ou a imprevistos geológicos e pluviométricos. Tudo que tem acontecido está associado à desordenada ocupação urbana de áreas geologicamente inadequadas" diz Santos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Em Teresópolis, morreram 238 pessoas, segundo a prefeitura e bombeiros (Foto: Marcondes Ferreira / G1)


Dilma libera ajuda e sobrevoa hoje áreas atingidas

Hoje, a presidente Dilma Rousseff irá ao Rio de Janeiro, onde sobrevoará as áreas atingidas pelas chuvas na Região Serrana. O governo federal vai liberar R$ 780 milhões para os Estados atingidos, incluindo o Rio e São Paulo. Serão R$ 700 milhões para a área de defesa civil do Ministério da Integração Nacional e R$ 80 milhões ao Ministério dos Transportes, para recuperação de pontes e estradas. A medida provisória com os recursos foi assinada ontem, e publicada em edição extra do Diário oficial da União. Parte desses recursos pode vir a ser transferida a outros Estados, no caso de novos desastres naturais. Dilma conversou ontem por telefone com o governador do Rio, Sérgio Cabral, e ofereceu apoio. Medicamentos e recursos da Defesa Civil já foram disponibilizados.


Teresópolis: casa de músico fica ilhada

Faltaram apenas três degraus para as águas da chuva invadirem o segundo andar da casa onde os dois filhos do músico George Israel, 50 anos, do Kid Abelha, passavam férias em Teresópolis, junto com três primos, um amigo e uma tia. O saxofonista tinha descido a serra com a mulher, na véspera, quando, por volta das 4h de ontem, o filho Leonardo, 15 anos, ligou para avisar que estavam ilhados. George não pensou duas vezes: assim que a situação se acalmou, alugou um helicóptero, por R$ 3 mil, para resgatar a família. A casa do músico fica no condomínio Fazenda da Paz, na Posse, refúgio escolhido por ele e Roberto Frejat, do Barão Vermelho, para compor e fazer os ensaios das bandas.


Região Serrana do Rio: estilista morre em deslizamento

Em meio à agitação do Fashion Rio, a quarta-feira foi de tristeza para o mundo da moda carioca devido à morte da estilista Daniela Conolly em decorrência dos deslizamentos na Região Serrana do Rio. "Queremos fazer uma homenagem a ela, mas ainda estamos digerindo a notícia", disse o produtor Robert Guimarães, criador do Rio Moda Hype, segmento do Fashion Rio dedicado a novos talentos. Daniela Conolly tinha 39 anos e estava hospedada em um sítio em Itaipava para comemorar o aniversário de seu pai, que também faleceu na madrugada desta quarta. Também morreram a mãe da estilista, o marido e o filho, de dois anos; além da babá que acompanhava a criança e três sobrinhos.


Três bombeiros soterrados

Três bombeiros foram soterrados na madrugada de ontem por uma avalanche de terra, em Nova Friburgo, no Rio, ao chegarem ao local para salvar vidas. Duas casas e duas lajes haviam sido atingidas pela terra e um prédio de quatro andares com cobertura e garagem desabou parcialmente. Um dos bombeiros envolvidos no resgate dos colegas de trabalho, Ricardo do Santos Loureiro, de 42 anos, atuou na Missão de Paz no Haiti, e disse que a maior dificuldade em Nova Friburgo, assim como ocorreu nas tragédias de Angra dos Reis e no Morro do Bumba, em 2010, é que, por se tratar de deslizamentos de terra, não é possível visualizar a estrutura das casas. Até as 18 horas de ontem, o resgate não havia sido concluído.


Quantidade de chuva

12 dias - Na Região Metropolitana de São Paulo e em Nova Friburgo (RJ) já choveu em 12 dias o equivalente à média histórica de todo o mês de janeiro

A Gazeta

Nenhum comentário:

Postar um comentário