sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Dinheiro fácil na internet na mira da polícia

Dinheiro fácil na internet na mira da polícia
Empresa Telexfree, com sede no Espírito Santo, virou febre e está sendo investigada. Há relatos de lucros individuais acima de R$ 3 milhões

Foto: Divulgação
Ator de Tropa de Elite ostenta ganhos

O ator Sandro Rocha, do filme Tropa de Elite, é um dos divulgadores do Telexfree que exibe a prosperidade promovida pelo sistema. Em um vídeo que postou no YouTube, mostra cálculos que o deram, em 27 dias, R$ 47.806. “Se eu pegar esse valor e dividir por 27, esse negócio me deu por dia R$ 1.770”, comemora.
O artista ganhou fama ao interpretar um policial que tinha como bordão as frases: “Quem quer rir, tem que fazer rir” e “Para eu te ajudar, você tem que me ajudar a te ajudar”.

R$ 70 mil

Outro que tem rendimentos impressionante no ramo do marketing multinível é o comerciante Henri Rocha, 33 anos, de Vitória. Em pouco mais de três meses na Multiclick Brasil, empresa do mesmo ramo, diz ter ganho cerca de R$ 70 mil.

Na Telexfree, ele atua de forma menos intensiva e diz ter ganho “apenas” R$ 8 mil em seis meses.

“Graças a Deus, pude comprar um Honda Civic zero quilômetro, um terreno em Arraial D'ajuda (BA), que estou terminando de pagar, e tenho minha casa própria. Essa grana me ajudou muito”, comentou.

Saiba maisComo surgiram -Os primeiros esquemas envolviam uma corrente postal, distribuída com uma lista de 5 a 10 nomes. Ao destinatário era dito que enviasse uma pequena quantia de dinheiro (tipicamente US$ 1 ou 5), por meio de carta, para a primeira pessoa da lista. Para sustentar esse crescimento exponencial, seria necessário que toda a população mundial entrasse no sistema.
Esquema Ponzi -Foi considerado uma sofisticada operação fraudulenta de investimento do tipo esquema em pirâmide. O negócio envolvia o pagamento de lucro anormal para os investidores. O nome do esquema refere-se ao criminoso financeiro italo-americano Charles Ponzi.
Uma empresa que atrai cada vez mais pessoas interessadas em ganhar dinheiro de forma fácil e rápida, na internet, sem sair de casa, está na mira da Polícia Civil e do Ministério Público Estadual. A hipótese é a prática do golpe da pirâmide financeira.

A suspeita paira sobre a Telexfree, empresa americana que tem sua sede brasileira localizada no Espírito Santo, e que é a grande promessa do momento, com relatos na web de pessoas que conseguiram lucrar até R$ 3 milhões em menos de um ano. A firma também é investigada em pelo menos outros três Estados – Acre, Mato Grosso e Pernambuco.

O problema está na forma como o grupo atua. Para entrar no negócio é preciso fazer depósito financeiro, recrutar novos seguidores e postar anúncios diariamente na internet. A fórmula para ganhar dinheiro? Convencer mais pessoas a fazer o mesmo.

Esse mesmo mecanismo já vem sendo questionado em outros Estados, por prejuízo causado a participantes de empresas como Mister Colibri e Multiclick.

No caso da Telexfree, a febre começou no ano passado e ainda não há seguidores que denunciaram prejuízo. Ao contrário, autônomos, comerciantes, metalúrgicos, bancários, bombeiros e até policiais entraram no negócio. Eles investiram R$ 10 mil, R$ 20 mil, venderam bens ou até saíram de seus empregos por acreditar na promessa de lucro da empresa.

A Telexfree afirma que a principal fonte de receita está na venda de serviço de telefonia via internet, chamada VoIP (voz sobre IP). Para isso, recruta “divulgadores” que publicam anúncios do produto em redes sociais e sites de classificados, e são remunerados por essa tarefa.

No entanto, os próprios divulgadores, em suas páginas, entregam uma incoerência do negócio, ao se concentrarem muito mais na conquista de novos membros – mais vantajosa financeiramente para eles – do que na propaganda do serviço de telefonia pelo computador. Com isso, predominam anúncios de recrutamento em detrimento da propaganda do VoIP, anunciado pela empresa como seu “carro chefe”.
Para a Telexfree, seu negócio é uma “nova forma de fazer publicidade”, já que seus 682 mil divulgadores no mundo – 90% deles no Brasil - colocam diariamente cerca de 2,3 milhões de anúncios da empresa na internet. Mas a “inovação” é vista com desconfiança pela polícia e analisada pelos promotores do Ministério Público.

A delegada Gracimeiri Gaviorno, da Delegacia de Defraudações e Falsificações (Defa), conduz a investigação sobre a empresa. Para ela, há indícios de que o modelo seja semelhante ao golpe da pirâmide financeira, que já levou várias pessoas à prisão, porque quando não há novas adesões, o esquema não se sustenta e os que estão embaixo ficam no prejuízo.
No caso da Telexfree, a polícia suspeita de crimes fiscais e tributários na atuação dos divulgadores, como contra a economia popular, com suposta formação de pirâmide; estelionato e crime de induzimento à especulação. As penas, somadas, podem chegar a 10 anos de cadeia.

“Fora outros crimes que podem estar relacionados a essa prática de crime contra a economia popular. Pode ter sonegação fiscal e falsidade ideológica. Até onde chegamos, temos probabilidade muito grande da empresas ter foco destinado à prática de crime, usando a máscara do marketing multinível. O crime previsto na Lei 1521/51 prevê a formação de redes em que há sistema binário, com base sustentando uma distribuição piramidal. Muitas pessoas têm ganho em cima de outras. Estas podem ter prejuízo”, disse.

A delegada adiantou que pessoas ligadas à empresa vão prestar depoimento nos próximos dias, inclusive os novos milionários.
Ex-vendedor de churrasquinho compra Ferrari

Um dos casos mais curiosos exibidos na internet pela Telexfree é o de Inocêncio Reis, o Pelé, um ex-vendedor de churrasquinho na Reta da Penha que conseguiu reunir R$ 3 milhões em 11 meses. Nos vídeos da empresa, ele conta sua trajetória, da vida dífícil e dívidas até a compra de uma Ferrari com dinheiro ganho com a Telexfree. E usa sua evolução financeira para convidar novos recrutas.
“Atingir R$ 1 milhão não é fácil, mas atingir dois milhões é mamão com açúcar. Três milhões... (também). Então, tenho certeza de que, em 2013, eu já esteja com patrimônio de R$ 10 milhões, com fé em Deus”. Veja vídeo.
 

Empresário nega golpe

O diretor de Marketing da Telexfree, Carlos Roberto Costa, rebate as acusações de que a empresa gerenciada por ele e outros dois sócios pratique o golpe da pirâmide financeira. Ele define o negócio como uma nova forma de fazer publicidade e vender serviço de telefonia via internet.

Segundo dados da empresa, são 682 mil divulgadores no mundo - 90% deles no Brasil, que colocam diariamente cerca de 2,3 milhões de anúncios da empresa na internet. A presença desses anunciantes faz do site da Telexfree o 50º em acessos no Brasil, segundo um dos principais monitores de tráfego.

De acordo com os sócios, a Telexfree atua no Brasil desde fevereiro de 2012. Funcionando em espaçosa sala comercial, a sede brasileira fica instalada no último andar de um edifício, na Enseada do Suá, em Vitória. Nos seus dez primeiros meses, dez pessoas conseguiram angariar pelo menos R$ 1 milhão. Os cheques costumam ser exibidos como troféus na internet.
Apesar disso, ele nega que a empresa ostente riqueza e repreende pessoas que exibem bens luxuosos na web. O advogado da empresa, Horst Fouchs, diz que até agora só há seis contestações judiciais movidas por ex-divulgadores contra a Telexfree. E essas serviram para comprovar a legalidade do negócio. Ele diz que três das ações passaram por conciliação e houve acordo com devolução do dinheiro.

Ministério Público de olho aberto

O Ministério Público Estadual também está de olho na empresa. Em nota, o órgão informou que recebeu uma representação sobre o caso e que o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) faz uma análise sobre ela “para fazer os encaminhamentos devidos”.
Professor Fernando Galdi explica o esquema da pirâmide

 
Sonho vira pesadelo

Seduzido pelos altos valores que o amigo dizia ganhar apenas assistindo vídeos de propaganda na internet, um porteiro de 45 anos, morador de Vila Velha, viu a vida financeira ser abalada ao pegar um empréstimo de R$ 10 mil com uma operadora de cartão de crédito para investir na empresa denominada Mister Colibri.

A ideia promissora deu lugar ao fracasso. A Mister Colibri é suspeita de desenvolver um negócio fraudulento para arrecadação indevida de recursos. Em dezembro passado, uma operação da Polícia Civil em Minas Gerais desbaratou o esquema. Dias depois, a Polícia Federal solicitou à Justiça a quebra dos sigilos bancário e fiscal dos donos da corporação. A suspeita é de que os donos do empreendimento também estejam por trás de outra pirâmide financeira: a Multiclick Brasil. Para entrar nesse grupo, é necessário investir de R$ 60 a R$ 2.750.

No caso da Mister Colibri, a promessa era remunerar em R$ 700 por semana quem assistisse 48 vídeos de propaganda. O porteiro repassou R$ 10 mil para o amigo que o convidou. Nas primeiras semanas tudo ocorreu conforme o combinado, até que a “fonte secou”.

“A visão da empresa mudou de repente, a gente não ganhava mais dinheiro só vendo vídeos. Tinha que vender produtos e cadastrar pessoas para entrar na Mister Colibri”, disse.

A empolgação do início deu lugar à incerteza e ao prejuízo. O amigo que o recrutou não evoluiu na hieraquia da comunidade e se endividou. Ele era o associado direto responsável por repassar o lucro ao porteiro.

“Minha vida está uma perturbação. A financeira liga direto para mim, para minha filha, para minha casa e até para o meu trabalho. Estou vivendo numa pressão psicológica imensa. Não tenho como pagar isso, só ganho R$ 750 por mês. Como vou pagar 25 vezes de R$ 700 que foi o acordo que fiz o cartão?”, questiona.

A Mister Colibri acumula 90 reclamações nos últimos 12 meses no site Reclame Aqui, recebendo o carimbo de “empresa não recomendada”. A reportagem tentou entrar em contato com a comunidade e com a Omnia Serviços, representante da empresa no Brasil, mas essas não disponibilizam contatos telefônicos válidos.
Mikaella Campos, Vinícius Valfré e Rodrigo Lira  
Fonte: A Gazeta

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