segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Como os homossexuais são retratados pela TV brasileira?


Como os homossexuais são retratados pela TV brasileira?
Segundo a avaliação de críticos e de militantes do movimento LGBT, houve avanços na programação, no entanto ainda é preciso melhorar

Na TV brasileira, uma simples cena de beijo entre pessoas do mesmo sexo rende intermináveis debates, com prós e contras. Enquanto isso, nos Estados Unidos, as emissoras passam pelo crivo da Aliança Contra a Difamação de Gays e Lésbicas (Glaad, na sigla em inglês). O grupo, que monitora o modo como homossexuais são retratados na TV americana, aprova a programação e declarou recentemente que homossexuais "são cada vez mais mostrados de maneira natural".
Apesar de caricata, a Valéria de Zorra Total não
é vista como depreciativa

Aqui, a presença de personagens gays nas novelas já passou por momentos críticos. Em 1995, o ator André Gonçalves foi agredido na rua por interpretar um homossexual em "A Próxima Vítima". Três anos depois, em "Torre de Babel", o casal de lésbicas vivido por Christiane Torloni e Silvia Pfeiffer causou polêmica, e as duas personagens foram mortas na explosão do shopping center que era cenário da trama.

De lá para cá, o quanto de avanço a caminho da tolerância à diversidade sexual houve no país em relação à maneira como a realidade de homossexuais é apresentada pelos programas de televisão?

Presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, Toni Reis diz que nas novelas da Globo, em geral, os personagens LGBT têm sido bem retratados, embora programas humorísticos ainda insistam na caricatura. "Apesar disso, conversei com muitas lideranças de travestis que aprovam a personagem Valéria, do ‘Zorra Total’. Elas a consideram muito forte e determinada. É uma personagem caricata, mas não depreciativa."

Para ele, outro amostra do avanço foi a presença de seis personagens homossexuais na novela "Insensato Coração", ano passado. Na trama de Gilberto Braga e Ricardo Linhares havia até um quiosque em Copacabana que funcionava como "point" gay.

Retrocesso

Foto: TV Globo/Divulgação.
O personagem Crô (Marcelo Serrado), de 
"Fina Estampa", foi sucesso de público

O jornalista Irineu Ramos Ribeiro, porém, discorda do exemplo citado por Toni. Doutorando em Psicologia pela PUC de São Paulo e autor do livro "A TV no Armário" (2010), ele aponta para um retrocesso após aquela novela, pois parte da sociedade pressionou a Globo na ocasião, e a emissora lançou a novela seguinte, "Fina Estampa", com apenas um personagem gay, o Crô.

"É uma relação de poder. A Globo foi acusada de levantar a bandeira gay. Mesmo não concordando com as reações, ela precisa ceder para aliviar a pressão. Assim, em ‘Fina Estampa’ havia só o Crô, um gay caricato, que não oferece ameaça e é mais aceitável. Ou seja, a televisão avançou num momento e retraiu logo em seguida, perdendo espaço para as correntes religiosas e conservadoras."

Segundo Toni, o problema maior hoje não está na ficção, mas nos programas religiosos e policiais, nos quais há discursos homofóbico, com pastores evangélicos pregando a "cura gay", por exemplo. Nesse ponto, a opinião dele coincide com a de Irineu, para quem a pressão religiosa é a pior. "Eles levam a situação para o imponderável..."

Integrante do Plur@l – Grupo de Diversidade Sexual, o jornalista Paulo Gois Bastos diz que personagens LGBT estão mais presentes na TV aberta. "Mas, assim como qualquer produto da mídia massiva, uma obra televisiva carrega em si as tensões entre a possibilidade de transgredir valores morais por meio da criação e as expectativas, quase sempre conservadoras, de um grande e heterogêneo público receptor."


Ele atribui parte desse avanço aos movimentos sociais, que pressionam o Estado para a implementação de políticas de direitos humanos e promoção da diversidade. "Claro que a veiculação de estereótipos continua, mas, quase sempre, as emissoras são constrangidas pela sociedade e por instituições públicas a se retratarem.

Irineu chama a atenção para a cobertura jornalística da Parada Gay em São Paulo, analisada por ele em 2007 e no ano seguinte. Na primeira, o evento foi noticiado 48 vezes. Segundo ele, a maioria motivada por um escândalo em torno de um kit distribuído pelo Ministério da Saúde orientando sobre os cuidados que se deveriam tomar nas relações sexuais e no uso de drogas. "No ano seguinte, como não houve escândalo, a parada foi noticiada apenas 29 vezes. O coroamento do movimento deixa de ser notícia se não estiver associado a um escândalo, quando poderíamos humanizar os gays, mostrar que são pessoas como todas as outras."

Fonte: A Gazeta

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