quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Migração em massa de haitianos deixa Brasiléia, no Acre, em "situação de colapso"


Migração em massa de haitianos deixa Brasiléia, no Acre, em "situação de colapso"
A onda migratória de haitianos ao Brasil começou em 2010, após o terremoto que devastou o país

O governo do Acre considera que o município de Brasiléia (AC), de 21 mil habitantes, na fronteira com a Bolívia, já enfrenta uma “situação caótica e de colapso” em decorrência da presença de 1,2 mil imigrantes do Haiti na cidade.

A onda migratória de haitianos ao Brasil começou em 2010, após o terremoto que devastou o país. No Acre, o governador Tião Viana (PT) optou por prestar atendimento humanitário. Os imigrantes recebem “vistos humanitários”, com os quais podem trabalhar e ter acesso a serviços de saúde e educação.

“Até aqui a população tem sido solidária para com os haitianos, mas na verdade a situação agora é caótica e de colapso. A cidade inteira está com medo de doenças. O serviço de saúde, que deveria atender aos moradores, está concentrado agora no atendimento de haitianos”, disse o secretário de Justiça e Direitos Humanos do Acre, Nilson Mourão.

Na virada do ano, quase 500 haitianos obtiveram autorização para ingressar em território brasileiro e se juntaram a mais de 800 compatriotas que já estavam em Brasiléia, a 235 quilômetros de Rio Branco, a capital do Estado.

“Nós, do governo estadual, chegamos no limite final de nossa capacidade. O governo federal precisa assumir a responsabilidade dele em resolver um problema complexo. É necessário apoio financeiro e auxílio profissional para que possamos enfrentar a migração em massa”, disse Mourão.

Os principais problemas na assistência aos imigrantes continuam sendo o fornecimento de alimentos e abrigos. O governo estadual considera insuficientes as 14 toneladas de alimentos que foram doados pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) na semana passada.

“As 14 toneladas de alimentos que foram doadas são suficientes apenas para 10 dias. Já foram consumidas quase sete toneladas de alimentos doados pela Conab. Temos 1250 pessoas que necessitam de três refeições por dia. Brasiléia não tem capacidade para suportar sozinha o impacto dessa situação”, acrescentou Mourão.

Numa crítica velada ao governo federal, o secretário de Comunicação do Acre, Leonildo Rosas, disse que o Estado tem mais imigrantes haitianos do que soldados do Exército Brasileiro na Força de Paz da Organização das Nações Unidas no Haiti.

“O Brasil enviou ao Haiti, em 2004, quando começou a Força de Paz da ONU, 1.200 soldados. Depois do terremoto, o contingente aumentou para 2.200 homens. Em Brasiléia, já temos 1.250 haitianos, mas por aqui já passaram outros 1.400 imigrantes. Apenas 150 deles se estabeleceram com trabalho no Acre”, disse Rosas.

Difícil travessia

Os imigrantes haitianos que buscam refúgio em massa no Acre estão sendo vítimas de extorsão, roubo, estupros e mortes quando percorrem territórios do Peru e da Bolívia. Relatório enviado ao ouvidor Carlos Alberto de Souza e Silva Júnior, da Secretaria Especial de Políticas da Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), denuncia que as mulheres haitianas  são separadas dos homens e violentadas.

De acordo com o relatório, assinado por Lúcia Maria Ribeiro de Lima, Coordenadora Geral do Comitê Gestor de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, ligado ao governo do Acre e à prefeitura de Rio Branco, a capital do Estado, algumas mulheres foram vítimas de tentativa de estupro e outras foram estupradas por taxistas peruanos e bolivianos.


O documento assinala que nas últimas duas semanas se intensificaram os relatos de haitianos assassinados no trajeto até o Brasil. Os haitianos que não possuem dinheiro ou bem de valor são amarrados, surrados e colocados nas margens das estradas de barro e com pouca movimentação.

Há relatos de corpos de negros, amarrados na beira da estrada. Na semana passada, foi relatada a existência de um grupo de 10 haitianos amarrados, abandonados na estrada, incluindo mortos entre eles.

“Isso tudo ocorre no caminho entre Peru e Bolívia, mais precisamente numa cidade chamada Soberania (Bolívia). Tais violências são praticadas por policiais da Força Nacional do Peru e da Bolívia e por taxistas que transportam os haitianos. Não há relato de envolvimento de brasileiros”, assinala o documento. O relatório enviado ao ouvidor da SEPPIR informa que “cerca de 3 mil haitianos já passaram pelo Acre e muito mais virá”.

“Ocorre que a fronteira brasileira está fechada e o Brasil exige que os haitianos peçam o visto antes de vir para cá. Por conta desta situação, os haitianos estão sendo vítimas de extorsão e roubo”. Segundo o relatório, objetos de valor (dinheiro, câmeras fotográficas, computador, perfume,  sabonete etc ) são roubados, mediante violência. Os roubos são praticados por Policiais da Guarda Nacional do Peru e da Bolívia e também por taxistas.

“Já nos reunimos com representantes (governo e movimento social) do Peru e da Bolívia. Mas pouco foi feito até o presente, principalmente no Peru e na Bolívia. Não tem como o governo brasileiro atuar, pois estas atrocidades ocorrem em solo peruano e boliviano”, acrescenta o documento.

Altino Machado/Terra

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